STF dá início a julgamento sobre ensino domiciliar
Julgamento foi suspenso após
manifestação das partes e do voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, e
deve ser retomado na sessão plenária do dia 12.
06/09/2018 19h50
Nesta quinta-feira (6), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)
iniciou o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 888815, que discute se o
ensino domiciliar (homeschooling) pode ser considerado meio lícito de
cumprimento, pela família, do dever de prover a educação dos filhos. Para o
relator da matéria, ministro Luís Roberto Barroso, o ensino domiciliar formal é
compatível com a Constituição Federal. A análise do RE deverá ser retomada na
sessão da próxima quarta-feira (12).
O recurso, que teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual
do STF em junho de 2016, tem origem em mandado de segurança impetrado pelos
pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da secretária de Educação do
Município de Canela (RS), que negou pedido para que a criança fosse educada em
casa e orientou-os a fazer matrícula na rede regular de ensino, onde até então
havia estudado.
Relator
No início do voto, o relator explicou que o homeschooling é
a prática pela qual os pais ou responsáveis assumem a responsabilidade pela
escolarização formal da criança e deixam de delegá-la às instituições formais
de ensino. As aulas podem ser ministradas pelos próprios pais ou por
professores particulares contratados, sendo que a principal característica é a
direção e responsabilidade pelo ensino ser dos pais, que optam por fazê-lo em
casa.
O ministro votou pelo provimento do recurso extraordinário
para garantir o direito à educação em casa, respeitados os parâmetros
apresentados no voto. Ele explicou que a discussão não está em saber se o
ensino domiciliar é melhor ou pior, mas envolve o “respeito às opções e
circunstâncias de quem prefere um caminho diferente”. Segundo o relator, as
motivações dos pais que optam pelo ensino domiciliar demonstra a preocupação
genuína com o desenvolvimento educacional pleno e adequado dos seus filhos.
“Nenhum pai ou mãe faz essa opção, que é muito mais trabalhosa, por preguiça
ou capricho”, afirmou, considerando haver razões relevantes e legítimas
para que essa opção possa ser respeitada pela Constituição.
O ministro também observou que a Constituição Federal não trata dessa
questão de forma específica, mas refere-se apenas ao ensino oficial, o que
leva a diversas interpretações. Ele expôs o panorama mundial do tratamento
da matéria, apontando os países que efetivamente permitem a educação
domiciliar, como é o caso do Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia.
Em seguida, rebateu todos os argumentos contrários à prática do homeschooling.
De acordo com ele, a escolarização formal em instituição oficial não é o único
padrão pedagógico autorizado pela CF, a qual, sob a ótica do relator, não
exclui outros mecanismos a serem utilizados pelos pais. Quanto ao argumento de
que o ensino domiciliar caracteriza crime de abandono intelectual, o ministro
salientou que nessa prática os pais estão provendo a educação, mas por meio de
um método diferente.
Ao afastar a ideia de que as famílias poderiam deixar os filhos fora da
escola por irresponsabilidade ou para que eles trabalhassem, o ministro Luís
Roberto Barroso destacou que as crianças em ensino domiciliar serão submetidas
a exames periódicos. Ele também afirmou que a socialização é importante, mas
considerou que as crianças podem conviver com outras em locais como igrejas,
clubes desportivos e parques públicos.
O ministro citou vários princípios constitucionais importantes, entre
eles os contidos nos artigos 205, 206 e 229, a serem aplicados no sentido
do melhor interesse da criança e ressaltou que a Constituição coloca a família
na frente do Estado no dever de prover educação. Para o relator, a ensino
domiciliar é uma opção não vedada pela Constituição brasileira “e a meu ver é
expressamente ressalvada por atos internacionais relevantes como a Declaração
Universal dos Direitos Humanos e pelo Pacto Internacional sobre Direitos
Econômicos Sociais e Culturais”.
Tese
Em seu voto, o relator propôs a seguinte tese de repercussão geral:
“É constitucional a prática de ensino domiciliar (homeschooling) a
crianças e adolescentes em virtude da sua compatibilidade com as finalidades e
os valores da educação infanto-juvenil, expressos na Constituição de 1988.”
Parâmetros
Por fim, o ministro Luís Roberto Barroso propôs algumas regras de
regulamentação da matéria, com base em limites constitucionais. Ao fixar a tese
de repercussão geral, o ministro destacou que os pais devem notificar as
Secretarias Municipais de Educação sobre a opção pelo ensino domiciliar; as
crianças devem ser submetidas a avaliações periódicas; os dados podem ser
compartilhados com outras autoridades, como Ministério Público; e se for
comprovada a deficiência na formação acadêmica, os pais serão notificados e,
caso não haja melhoria no rendimento da criança ou do adolescente, os órgãos
públicos competentes determinarem a matrícula nos estabelecimentos regulares.
EC/CR
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=389073
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