Plenário declara a impossibilidade da condução coercitiva de réu ou investigado para interrogatório
Por decisão majoritária, os
ministros julgaram a medida referente ao interrogatório, prevista no artigo 260
do Código de Processo Penal, incompatível com a Constituição Federal de 1988.
14/06/2018 19h25
Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)
declarou que a condução coercitiva de réu ou investigado para interrogatório,
constante do artigo 260 do Código de Processo Penal (CPP), não foi recepcionada
pela Constituição de 1988. A decisão foi tomada no julgamento das Arguições de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, ajuizadas,
respectivamente, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e pela Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB). O emprego da medida, segundo o entendimento majoritário,
representa restrição à liberdade de locomoção e viola a presunção de não
culpabilidade, sendo, portanto, incompatível com a Constituição Federal.
Pela decisão do Plenário, o agente ou a autoridade que desobedecerem a
decisão poderão ser responsabilizados nos âmbitos disciplinar, civil e penal.
As provas obtidas por meio do interrogatório ilegal também podem ser
consideradas ilícitas, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado. Ao
proclamar o resultado do julgamento, a presidente do STF, ministra Cármen
Lúcia, ressaltou ainda que a decisão do Tribunal não desconstitui
interrogatórios realizados até a data de hoje (14), mesmo que o investigado ou
réu tenha sido coercitivamente conduzido para tal ato.
Julgamento
Julgamento
O julgamento teve início no último dia 7, com a manifestação das partes
e dos amici curiae e com o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, pela
procedência das ações. Na continuação, na sessão de ontem (13), a ministra Rosa
Weber acompanhou o voto do relator.
O ministro Alexandre de Moraes divergiu parcialmente, entendendo que a
condução coercitiva é legítima apenas quando o investigado não tiver atendido,
injustificadamente, prévia intimação. O ministro Edson Fachin divergiu em maior
extensão. Segundo ele, para decretação da condução coercitiva com fins de
interrogatório é necessária a prévia intimação do investigado e sua ausência
injustificada, mas a medida também é cabível sempre que a condução ocorrer em
substituição a medida cautelar mais grave, a exemplo da prisão preventiva e da
prisão temporária, devendo ser assegurado ao acusado os direitos
constitucionais, entre eles o de permanecer em silêncio. Seu voto foi
acompanhado pelos ministros Roberto Barroso e Luiz Fux.
O julgamento foi retomado na tarde desta quinta-feira (14) com o voto do
ministro Dias Toffoli, que acompanhou o relator. Para o ministro, é dever do
Supremo, na tutela da liberdade de locomoção, “zelar pela estrita observância
dos limites legais para a imposição da condução coercitiva, sem dar margem para
que se adotem interpretações criativas que atentem contra o direito fundamental
de ir e vir, a garantia do contraditório e da ampla defesa e a garantia da não
autoincriminação”.
O ministro Ricardo Lewandowski também acompanhou a corrente majoritária,
e afirmou que se voltar contra conduções coercitivas nada tem a ver com a
proteção de acusados ricos nem com a tentativa de dificultar o combate à
corrupção. “Por mais que se possa ceder ao clamor público, os operadores do
direito, sobretudo os magistrados, devem evitar a adoção de atos que viraram
rotina nos dias atuais, tais como o televisionamento de audiências sob sigilo,
as interceptações telefônicas ininterruptas, o deferimento de condução coercitiva
sem que tenha havido a intimação prévia do acusado, os vazamentos de conversas
sigilosas e de delações não homologadas e as prisões provisórias alongadas,
dentre outras violações inadmissíveis em um estado democrático de direito”,
disse.
Para o ministro Marco Aurélio, que também votou pela procedência das
ações, o artigo 260 do CPP não foi recepcionado pela Constituição Federal de
1998 quanto à condução coercitiva para interrogatório. O ministro considerou
não haver dúvida de que o instituto cerceia a liberdade de ir e vir e ocorre
mediante um ato de força praticado pelo Estado. A medida, a seu ver, causa
desgaste irreparável da imagem do cidadão frente aos semelhantes, alcançando a
sua dignidade.
Votou no mesmo sentido o ministro Celso de Mello, ressaltando que a
condução coercitiva para interrogatório é inadmissível sob o ponto de vista
constitucional, com base na garantia do devido processo penal e da prerrogativa
quanto à autoincriminação. Ele explicou ainda que, para ser validamente
efetivado, o mandato de condução coercitiva, nas hipóteses de testemunhas e
peritos, por exemplo, é necessário o cumprimento dos seguintes pressupostos:
prévia e regular intimação pessoal do convocado para comparecer perante a
autoridade competente, não comparecimento ao ato processual designado e
inexistência de causa legítima que justifique a ausência ao ato processual que
motivou a convocação.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, acompanhou o voto do
ministro Edson Fachin. De acordo com ela, a condução coercitiva interpretada,
aplicada e praticada nos termos da lei não contraria, por si só, direitos
fundamentais. Ressaltou, entretanto, que não se pode aceitar “qualquer forma de
abuso que venha a ocorrer em casos de condução coercitiva, prisão ou qualquer
ato praticado por juiz em matéria penal”.
Leia a íntegra dos votos do ministro Alexandre de Moraes,
do ministro Edson Fachin e
do ministro Celso de Mello.
EC,SP/CR
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=381510
Comentários
Postar um comentário