2ª Turma nega HC que questionava criminalização de desacato de civil contra militar
Por maioria, o colegiado seguiu o voto do relator
do HC, ministro Gilmar Mendes, no sentido de manter a condenação de civil que
desacatou militar no exercício da função, julgando válido o tipo penal previsto
no Código Penal Militar
13/03/2018
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou Habeas Corpus
(HC 141949) a um civil condenado pelo crime de desacato a militar que se
encontrava no exercício de suas funções. Segundo entendimento da maioria do
colegiado, a tipificação do delito (artigo 299 do Código Penal Militar) não é
incompatível com a Constituição Federal e com a Convenção Americana de Direitos
Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
Caso
O civil foi condenado à pena de seis meses de detenção, em regime
aberto, e obteve o benefício do sursis (suspensão condicional da pena) pelo
prazo de dois anos e o direito de apelar em liberdade. Conforme a denúncia, ele
desacatou um 2º sargento que se encontrava no exercício de sua função na 4ª
Seção do Batalhão da Guarda Presidencial, em Brasília, ao chamá-lo de “palhaço”
na presença de outros militares. A condenação foi mantida pelo Superior
Tribunal Militar (STM) ao julgar apelação.
No STF, a defesa alegava a inconstitucionalidade e a inconvencionalidade
do crime de desacato aplicado a civis no âmbito da Justiça Militar da União.
Sustentou, em síntese, que a condenação de um civil no âmbito da Justiça
Militar ofende não só o artigo 13 do Pacto de São José da Costa Rica como
também a Constituição Federal, que garante a liberdade de expressão e de
pensamento (artigos 5º, incisos IV, VIII e IX, e 220).
Lembrou ainda que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) descriminalizou a
conduta tipificada como crime de desacato por entender que esta ofende o Pacto
de São José.
Relator
O relator do HC, ministro Gilmar Mendes, explicou que o sujeito passivo
do crime de desacato é o Estado, sendo o funcionário público vítima secundária
da infração. Segundo o ministro, a tutela penal no caso visa assegurar o normal
funcionamento do Estado, protegendo-se o prestígio do exercício da função
pública. Mendes destacou ainda que é essencial para a configuração do delito
que o funcionário esteja no exercício da função ou, estando fora, que a ofensa
seja empregada em razão dela.
Para o ministro, da leitura do dispositivo da Convenção Americana de
Direitos Humanos não se infere qualquer afronta na tipificação do crime de
desacato. Ele observou que o artigo 13 do Pacto de São José da Costa Rica
dispõe claramente que o exercício do direto à liberdade de pensamento e de
expressão, embora não sujeito a censura prévia, deve assumir responsabilidades
ulteriores expressamente fixadas em lei para se assegurar o respeito aos
direitos ou a reputação das demais pessoas. “A liberdade de expressão prevista
na Convenção não difere do tratamento conferido pela Constituição ao mesmo
tema, não possuindo esse específico direito, como todos os demais direitos
fundamentais, caráter absoluto”, ressaltou. Para o relator, o direito à
liberdade de expressão deve se harmonizar com os demais direitos envolvidos –
honra, dignidade, intimidade –, e não eliminá-los.
O ministro destacou ainda que o desacato constitui importante
instrumento de preservação da lisura da função pública e, indiretamente, da
própria dignidade de quem a exerce. “A figura penal do desacato não tolhe o
direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre
manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem definidos,
punindo-se os excessos”, afirmou. Ao contrário do que alegado pela defesa, o
relator concluiu que não há constrangimento ilegal e, por isso, votou pela
denegação do habeas corpus.
Os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski acompanharam o relator.
Divergência
Ao divergir do relator, o ministro Edson Fachin defendeu que a Convenção
Interamericana dos Direitos Humanos é incompatível com as leis que criminalizam
o desacato. “Os órgãos do sistema interamericano registraram, em diversas
oportunidades, que os chamados delitos de desacato são incompatíveis com o
direito à liberdade de expressão e pensamento, tal como expresso no Artigo 13
do Pacto de São José”, afirmou. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos
assentou ainda, segundo Fachin, que a penalização de qualquer tipo de expressão
só pode ser aplicada em circunstâncias excepcionais, nas quais exista uma
ameaça evidente e direta de violência anárquica.
O ministro citou ainda manifestações de órgãos internacionais que
defendem, dentre outros pontos, que as leis de desacato são mais restritivas e
protegem grupos seletos, distinguem pessoas públicas de privadas e subvertem o
princípio republicano ao outorgar aos funcionários públicos uma proteção maior
do que a que dispõem as demais pessoas.
Segundo ele, a a criminalização da conduta em questão não encontra respaldo na ordem democrática brasileira, seja sob o prisma da Constituição Federal, seja dos tratados e convenções sobre direitos humanos. Fachin votou, assim, pela concessão do habeas corpus para reconhecer a nulidade da condenação.
Segundo ele, a a criminalização da conduta em questão não encontra respaldo na ordem democrática brasileira, seja sob o prisma da Constituição Federal, seja dos tratados e convenções sobre direitos humanos. Fachin votou, assim, pela concessão do habeas corpus para reconhecer a nulidade da condenação.
SP/AD
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Processo
relacionado: HC 141949
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=372202
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