“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

DIREITO DE PETICIONAR - Advogado não pode ser punido por estelionato jurídico, pois delito não existe





A figura do “estelionato jurídico” não existe na legislação, por isso nenhum advogado pode ser punido com base nesse conceito. Com esse entendimento, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais trancou ação penal contra um advogado que, juntamente com mais dois profissionais, teria movido ação judicial com pedido idêntico a uma já proposta em outro juízo, cujo resultado foi favorável a eles.
O trio foi denunciado conforme o artigo 171 do Código Penal — obtenção para si ou outrem de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
O relator para o acórdão, desembargador Doorgal Andrada, entendeu que a conduta do advogado é atípica, já que inexiste no ordenamento jurídico o delito de “estelionato judiciário”.

Segundo o magistrado, a Constituição Federal assegura a todos o acesso à Justiça, bem como o princípio do direito de ação. Ou seja, o legislador elevou o direito de ação ao “status” de direito humano fundamental, inerente à existência de uma sociedade e seu funcionamento.
Nesse sentido, imputar ao advogado a conduta prevista no artigo 171 do CP se traduz em flagrante limitação do direito humano fundamental de acesso ao Judiciário, impedindo o exercício da cidadania, de acordo com o desembargador.
Para o desembargador, a conduta do advogado é totalmente atípica, mas cabe ao Judiciário analisar e decidir o pedido, ainda que se considere que o objetivo seja impróprio, inconveniente ou até com indícios de má-fé. Para tais situações, existem instrumentos cíveis e administrativos, como multa pela litigância de má-fé, bem como os órgãos de classe, para apurar e coibir suposta conduta indisciplinar dos profissionais envolvidos.
Assim, para o desembargador, dar prosseguimento a uma ação penal se traduziria à ofensa ao princípio do direito de peticionar junto ao Judiciário.
O desembargador Corrêa Camargo acompanhou o voto do desembargador Doorgal Andrada. A decisão não foi unânime. Júlio Cezar Guttierrez entendeu que, pelo fato de haver indícios suficientes de autoria delitiva, deve-se colher provas e não trancar a ação penal. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.
Processo 10000.17.092148/0.000

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