Ministra Rosa Weber suspende efeitos de portaria ministerial sobre trabalho escravo
Terça-feira, 24 de outubro de 2017
Liminar da ministra
Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspende a Portaria 1.129/2017
do Ministério do Trabalho que altera regras de fiscalização no combate ao
trabalho escravo e cria nova definição aos conceitos de trabalho forçado,
jornada exaustiva e condições análogas à de escravo, para, entre outros fins, a
concessão de seguro desemprego.
A liminar foi
deferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 489,
ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade. Tramita ainda no STF ação
semelhante (ADPF 491) ajuizada pela Confederação Nacional das Profissões
Liberais (CNPL), também sob relatoria da ministra Rosa Weber.
Em sua decisão na
ação proposta pela Rede, a ministra considera cabível a ADPF, observando que a
definição conceitual proposta na portaria ministerial “afeta as ações e
políticas públicas do Estado brasileiro, no tocante ao combate ao trabalho
escravo, em três dimensões: repressiva (ao repercutir nas fiscalizações
procedidas pelo Ministério do Trabalho), pedagógico-preventiva (ao disciplinar
a inclusão de nomes no Cadastro de Empregadores que tenham submetido
trabalhadores à condição análoga à de escravo) e reparativa (concessão de
seguro-desemprego ao trabalhador resgatado)”.
Nesse sentido, a
relatora afirma que tais definições conceituais, “sobremodo restritivas”, não
se coadunam com o que exige o ordenamento jurídico brasileiro, os tratados
internacionais celebrados pelo Brasil e a jurisprudência dos tribunais sobre a
matéria.
Como revela a
evolução do direito internacional sobre o tema, afirma a ministra em sua
decisão, "a 'escravidão moderna' é mais sutil e o cerceamento da liberdade
pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente
físicos”.
“A violação do
direito ao trabalho digno, com impacto na capacidade da vítima de realizar
escolhas segundo a sua livre determinação, também significa ‘reduzir alguém a
condição análoga à de escravo’”, prossegue a relatora em sua decisão.
“Por evidente, não
é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo”,
diz a ministra. Entretanto, acrescenta que, se atinge níveis gritantes e se
submetidos os trabalhadores a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a
condições degradantes, com a privação de sua liberdade e de sua dignidade,
“resulta configurada, mesmo na ausência de coação direta contra a liberdade de
ir e vir, hipótese de sujeição de trabalhadores a tratamento análogo ao de
escravos, nos moldes do artigo 149 do Código Penal, com a redação que lhe foi
conferida pela Lei nº 10.803/2003”, afirma.
Na avaliação da
ministra, a portaria ministerial esvazia o conceito de jornada exaustiva de
trabalho e trabalho forçado; introduz, sem base legal, “o isolamento
geográfico” como elemento necessário à configuração de hipótese de cerceamento
do uso de meios de transporte pelo trabalhador; e coloca a presença de
segurança armada, como requisito da caracterização da retenção coercitiva do
trabalhador no local de trabalho em razão de dívida contraída.
Toda essa mudança
de conceito, segundo a relatora, atenua o alcance das políticas de repressão,
de prevenção e de reparação às vítimas do trabalho em condições análogas à de
escravo e contraria 20 anos de trajetória jurídica e administrativa realizada
pelo Brasil no sentido do combate à escravidão contemporânea, com instrumentos
e mecanismos técnicos reconhecidos internacionalmente.
“Tais mecanismos e
instrumentos estavam configurados justamente na ‘lista suja’, na forma da
inspeção do trabalho e no enfrentamento da impunidade pelos Grupos Especiais de
Fiscalização Móvel, por meio da atividade de investigação, processamento e
punição dos responsáveis pelos delitos, conforme nota divulgada pela
Organização Internacional do Trabalho”.
A relatora lembra
que mesmo esses mecanismos ainda não foram suficientes para coibir a prática do
trabalho escravo moderno e o tráfico de pessoas em algumas regiões do país,
levando o Brasil à condenação pela Corte Interamericana de Direitos
Humanos no caso Fazenda Brasil Verde.
Liminar
Para a concessão da
liminar a relatora considerou presentes os pressupostos da plausibilidade
jurídica do pedido (fumus boni juris) e perigo de demora na decisão (periculum
in mora), diante do risco “de comprometimento dos resultados alcançados
durante anos de desenvolvimento de políticas públicas de combate à odiosa
prática de sujeitar trabalhadores à condição análoga à de escravo”, caso a
portaria produza efeitos.
Segundo a ministra,
a Portaria 1.129/2017 do Ministério do Trabalho “tem como provável efeito
prático a ampliação do lapso temporal durante o qual ainda persistirá aberta no
Brasil a chaga do trabalho escravo, trazendo danos contínuos à dignidade das
pessoas.
Assim, a ministra
Rosa Weber deferiu a liminar, a ser referendada pelo Plenário, “com o caráter
precário próprio aos juízos perfunctórios e sem prejuízo de exame mais
aprofundado quando do julgamento do mérito” para suspender os efeitos da
portaria ministerial.
Em seguida a
ministra requisitou informações ao ministro do Trabalho, e pareceres da
Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República.
AR/CR
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20/10/2017 - Ação pede
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ADPF 489 |
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=359907
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