Filiação socioafetiva não impede reconhecimento de paternidade biológica e seus efeitos patrimoniais
A Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu ser possível a um filho receber
herança tanto por parte do pai biológico quanto por parte do pai registral.
O colegiado
entendeu que, tendo alguém usufruído de uma relação filial socioafetiva, por
imposição de terceiros que consagraram tal situação em seu registro de
nascimento, “ao conhecer sua verdade biológica, tem direito ao reconhecimento
da sua ancestralidade, bem como a todos os efeitos patrimoniais inerentes ao
vínculo genético”, conforme afirmou o relator, ministro Villas Bôas Cueva.
Na origem, a ação
de investigação de paternidade foi proposta quando o filho biológico já contava
com 61 anos. Seu pai registral já havia falecido e lhe deixado herança. De
acordo com os autos, o autor tomou conhecimento de sua suposta filiação
biológica em 1981, porém, apenas em 2008 ingressou com a ação. Pediu que fosse
realizado exame de DNA e reconhecido seu direito à filiação, com todos os
efeitos inerentes à nova condição, incluindo-se os patrimoniais. O pai
biológico faleceu antes de ser citado.
Interesse na
herança
Incluídos no polo
passivo da ação, os sucessores do pai biológico alegaram que a intenção do
autor “teria fundo meramente patrimonial”.
O tribunal de
segunda instância manteve a sentença que afastava a possibilidade de alteração
do registro civil do autor, além de qualquer repercussão patrimonial, visto que
havia sido comprovada a filiação socioafetiva, fato que gerou inclusive efeitos
patrimoniais.
De acordo com
Villas Bôas Cueva, a Constituição de 1988 inovou o direito de família ao
permitir a igualdade de filiação, “afastando a odiosa distinção até então
existente entre filhos legítimos, legitimados e ilegítimos”, conforme
estabelece o parágrafo 6º do artigo 227.
Coexistência
reconhecida
O ministro lembrou
que o Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário 898.060, com
repercussão geral, no qual admitiu a coexistência entre as paternidades
biológica e socioafetiva, “afastando qualquer interpretação apta a ensejar a
hierarquização dos vínculos”.
Segundo Villas Bôas
Cueva, a existência de vínculo com o pai registral não é obstáculo ao exercício
do direito de busca da origem genética ou de reconhecimento de paternidade
biológica, pois os direitos à ancestralidade, à origem genética e ao afeto são
compatíveis.
Para o relator, a
paternidade gera determinadas responsabilidades morais ou patrimoniais, devendo
ser assegurados os direitos hereditários decorrentes da comprovação da
filiação.
Nesse sentido, “a
pessoa criada e registrada por pai socioafetivo não precisa, portanto, negar
sua paternidade biológica, e muito menos abdicar de direitos inerentes ao seu
novo status familiae, tais como os direitos hereditários”.
O número deste
processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
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