Plenário confirma afastamento de Eduardo Cunha do mandato na Câmara
Quinta-feira, 05 de maio de 2016
O Supremo
Tribunal Federal (STF) referendou nesta quinta-feira (5) decisão do ministro
Teori Zavascki, proferida na Ação Cautelar (AC) 4070, que suspendeu Eduardo
Cunha (PMDB-RJ) do exercício do mandato de deputado federal e, por
consequência, da função de presidente da Câmara dos Deputados. Segundo o
entendimento adotado pelos ministros, o afastamento é uma medida necessária
para impedir a interferência do deputado em investigações criminais, e não
implica interferência indevida do Judiciário no Poder Legislativo, uma vez que
a autonomia dos parlamentares não é ilimitada, e ambos os Poderes se submetem à
Constituição Federal.
Por unanimidade, os
ministros acompanharam o posicionamento de Teori Zavascki, que deferiu a medida
requerida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o qual apontou uma
série de evidências de que Eduardo Cunha agiu com desvio de finalidade para
atender a seus próprios interesses. Segundo o pedido, o deputado teria coagido
testemunhas e tentado interferir na condução de investigações de natureza penal
e disciplinar, e atuado, em conjunto com outros parlamentares, para pressionar
empresários ou pessoas que contrariassem seus interesses.
“Há indícios de que
o requerido, na sua condição de parlamentar e, mais ainda, de presidente da
Câmara dos Deputados, tem meios e é capaz de efetivamente obstruir a
investigação, a colheita de provas, intimidar testemunhas e impedir, ainda que
indiretamente, o regular trâmite da ação penal em curso no Supremo Tribunal
Federal, assim como das diversas investigações existentes nos inquéritos
regularmente instaurados”, afirmou o ministro Teori Zavascki.
Interferência em
comissões
Os indícios apontam
para a coação de testemunhas na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da
Petrobras, além de interferência da Comissão de Fiscalização de Contratos, a
fim de coagir empresários, e no Conselho de Ética, onde responde a processo
disciplinar. No STF, o parlamentar é investigado também em outros inquéritos. A
denúncia do Inquérito 3983 foi recebida por unanimidade pelo Plenário do STF, o
que possibilita abertura de ação penal.
Na fundamentação da
decisão, o ministro Teori Zavascki citou o artigo 282 do Código de Processo
Penal (CPP), segundo o qual cabem medidas cautelares em processo penal para
assegurar a aplicação da lei, resguardar a conveniência das investigações e da
instrução penal e evitar a prática de infrações penais.
Presidência da
Câmara
O ministro Teori
Zavascki sustentou ainda que a posição de presidente da Câmara dos Deputados
não imuniza o parlamentar a eventuais medidas penais de caráter cautelar, pelo
contrário, exigindo que esse escrutínio seja ainda mais aprofundado. “Se a
investidura por sufrágio popular não é bastante para tornar o exercício de
mandato eletivo infenso a toda e qualquer forma de controle judicial, tanto
menos o será a diplomação obtida por eleição interna, para o exercício de
funções executivas”, afirmou.
A decisão ainda
ressalta ainda a iminência da instauração, pelo Senado Federal, de processo de impeachmentcontra
a presidente da República, o que colocaria Eduardo Cunha como primeiro
substituto do cargo. E entre os requisitos mínimos para o exercício da
presidência da República está expressa na Constituição Federal a exigência de
não ser réu em ação penal no Supremo. Para Teori Zavascki, isso também indica
que o investigado não possui condições para exercer as responsabilidades do
cargo de presidente da Câmara dos Deputados, uma vez que não se qualifica para
a substituição da Presidência da República.
Independência entre
os Poderes
Por fim, o ministro
reforçou que sua decisão não implica interferência indevida em outro poder, uma
vez que todos os Poderes são independentes entre si, mas jamais independentes
da Constituição. “O mandato, seja ele outorgado pelo povo, para o exercício de
sua representação, ou endossado pelos demais deputados, para a liderança de sua
instituição, não é um título vazio, que autoriza expectativas de poder
ilimitadas, irresponsáveis ou sem sentido”, destacou.
Excepcionalidade
O princípio
constitucional da separação dos Poderes da República e a excepcionalidade do
caso concreto foram destacados também pelos demais ministros durante o
julgamento. “A situação posta está muito longe de haver ingerência de um Poder
sobre outro”, afirmou o ministro Luiz Fux, lembrando que a medida adotada está
prevista entre as tutelas de urgência no campo do processo penal, “diante do
perigo de se frustrar toda uma atividade probatória”.
O ministro Dias
Toffoli lembrou que o país tem mais de 5.500 municípios e respectivas câmaras
de vereadores, 26 assembleias legislativas e uma câmara distrital, e enfatizou
que a suspensão de um mandato popular só pode ocorrer em circunstâncias
realmente necessárias, comprovadas e plausíveis. “Não é desejo de ninguém que
isso passe a ser instrumento de valoração de um Poder sobre outro, de
empoderamento do Poder Judiciário em relação aos Poderes eleitos
democraticamente pelo voto popular”, assinalou.
A ministra Cármen
Lúcia destacou que o STF defende e guarda a Constituição. “A imunidade referente
ao cargo não pode ser confundida com impunidade”, afirmou, observando que a
decisão se dá de maneira excepcional e “indubitavelmente coerente com a
Constituição”.
O voto do ministro
Gilmar Mendes ressaltou pontos que tornaram a decisão urgente, diante do
possível afastamento da presidente da República pelo processo de impeachment em
exame no Senado Federal e dos reflexos na linha sucessória. Destacou, porém,
que esse tipo de solução “não pode ser matéria do cotidiano”, e que as
garantias outorgadas aos parlamentares dão solidez ao próprio modelo de
democracia representativa. O ministro assinalou que a autonomia entre os
Poderes não pode se confundir com soberania. “Quando fatos graves ocorrem em um
Poder sem possibilidade de resposta de correção por ele próprio, já estamos
fora de um modelo normal de autonomia”, disse.
Para o ministro
Marco Aurélio, a medida acauteladora, prevista no artigo 319 do Código de
Processo Penal, não é drástica, diante dos indícios e práticas implementadas
por Eduardo Cunha no exercício do cargo e do mandato. No mesmo sentido, o
ministro Celso de Mello lembrou que, no sistema jurídico brasileiro, os membros
dos Poderes e os agentes públicos não são imunes ao afastamento preventivo de
suas funções. A previsão de afastamento do ocupante da Presidência da República
no caso de recebimento de denúncia, assinalou, estende-se aos governadores,
prefeitos e magistrados. “Este caso é realmente extraordinário e excepcional, e
este julgamento se dá precisamente em razão das peculiaridades apresentadas
pelo relator”, concluiu.
Tempo próprio
Ao encerrar o
julgamento, o presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski, disse que o
Poder Judiciário, especialmente o STF, está atento ao que acontece no país e
tem ofertado sua prestação jurisdicional no seu devido tempo. “Mas é preciso
ressaltar que o tempo do Judiciário não é o da política nem o da mídia”,
afirmou. “Temos ritos e prazos a observar”.
Segundo o
presidente, o ministro Teori Zavascki “não podia decidir antes de dar voz às
partes envolvidas”, e só o fez depois da vinda aos autos de novas provas,
“algumas recentíssimas”, e num momento em que se revelou uma nova urgência – a
proximidade de votação pelo Senado do eventual afastamento da presidente da
República, que pode colocar Eduardo Cunha na linha de sucessão.
Para Lewandowski, o
afastamento cautelar do presidente da Câmara é uma medida com respaldo legal e
“extremamente comedida” e adequada. “O relator a escolheu em lugar da prisão
preventiva ou outras alternativas que tinha à disposição, e baseado num
robustíssimo contexto fático-probatório”. Ele reiterou ainda que não há
qualquer ingerência do Judiciário sobre o Legislativo. “Estamos atuando dentro
dos limites da nossa competência e ação jurisdicional”, afirmou. “A proposta do
relator limitou-se a suspender o exercício do cargo de presidente da Câmara e
das funções de deputado federal. Uma eventual cassação do mandato continua sob
a competência da Câmara, e haverá de ser tomada, se for o caso, a critério dos
parlamentares”, concluiu.
FT,CF/FB
Processos relacionados
AC 4070 |
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=316009
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