“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

Liminar autoriza portal de Teresina (PI) a veicular notícias sobre caso policial


O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, deferiu medida cautelar ao Portal AZ Ltda. contra decisão do Juízo de Direito da 9ª Vara Cível de Teresina (PI) que determinou que a página se abstivesse de publicar notícias relativas a um caso policial local. Segundo o ministro, é inadmissível a censura estatal, “inclusive aquela imposta pelo Poder Judiciário” à liberdade de expressão, tema tratado no STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130. A decisão liminar foi tomada na Reclamação (RCL) 20757.
Segundo o juízo de primeiro grau, seria “desproporcional e desarrazoável a reiteração de notícias sobre o mesmo caso quando ausentes fatos novos”. As notícias referem-se a Fernanda Lages, estudante encontrada morta em 2011 numa obra em Teresina. A determinação de que o portal se abstenha de tratar do tema atendeu a pedido de um dos investigados.

Na decisão, o ministro Celso de Mello assinala que a questão, já tratada por ele em diversos precedentes, tem “indiscutível magnitude de ordem político-jurídica, notadamente em face de seus claros delineamentos constitucionais que foram analisados de modo efetivo no julgamento da ADPF 130”. Nela, o STF “pôs em destaque, de maneira muito expressiva, uma das mais relevantes franquias constitucionais: a liberdade de manifestação do pensamento, que representa um dos fundamentos em que se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito e que não pode ser restringida, por isso mesmo, pelo exercício ilegítimo da censura estatal, ainda que praticada em sede jurisdicional”.
Segundo o ministro, a interdição judicial imposta ao portal e a seu proprietário, sob pena de multa de R$ 5 mil por publicação, “configura clara transgressão” ao comando da decisão proferida pelo Supremo, com efeito vinculante, na ADPF 130. A decisão menciona diversos precedentes do STF que desautorizam a utilização, pelo Judiciário, do poder de cautela como instrumento de interdição dos meios de comunicação, mesmo em ambientes virtuais.
O ministro ressalta acordos e tratados internacionais ratificados pelo Brasil que reiteram a imprensa livre como condição fundamental do Estado Democrático de Direito – entre eles a Declaração de Chapultepec, adotada em 1994 pela Conferência Hemisférica sobre liberdade de expressão, a Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, promulgada pela III Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em 1948, e a Convenção Americana de Direitos Humanos, também denominada Pacto de São José da Costa Rica. “O fato é que não podemos – nem devemos – retroceder nesse processo de conquista e de reafirmação das liberdades democráticas”, afirmou. “Não se trata de preocupação retórica, pois o peso da censura – ninguém o ignora – é algo insuportável e absolutamente intolerável”.
O deferimento da cautelar suspende a eficácia da decisão do Juízo da 9ª Vara Cível de Teresina e autoriza, desse modo, a normal veiculação, pelo Portal AZ, de matéria jornalística sobre o tema censurado, afastando a incidência da multa por publicação, imposta pelo magistrado.
CF/CR


http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=292049

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