Lei Anticorrupção: regulamentação da Dilma busca a farsa
LUIZ FLÁVIO GOMES
Jurista e professor universitário. Fundador da Rede de Ensino LFG.
Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi promotor de Justiça (1980 a
1983), juiz de Direito (1983 a 1998) e advogado (1999 a 2001).
A famigerada lei anticorrupção das pessoas jurídicas (Lei 12.846/13), vigente desde 29/1/14, demorou 19 meses
para ser regulamentada. A rigor, apenas o parágrafo único do art. 7º (sobrea compliance) carecia
de normativa complementar. O decreto8.420, de 18/3/15, no entanto, conta com 53 artigos.
Deitou-se e rolou-se em cima da lei, com o propósito inequívoco de imoralmente
coonestar as práticas corruptas das empresas envolvidas na Operação Lava Jato e
salvar (tanto quanto possível) seus patrimônios assim como a continuidade dos
seus “negócios escusos” com o Estado cleptocrata e suas autarquias. A
regulamentação “revogou” a lei ou deturpou seu espírito original em vários
pontos (transformando-a praticamente em uma lei “para inglês ver”).
Seguem as aberrações que,
segundo o advogado Modesto Carvalhosa: O Globo eEstadão,
visam a promover uma anistia ampla e irrestrita para as empresas que são “muito
grandes para quebrar”: a atribuição para processar uma denúncia foi dada ao
Ministro de cada área (não à Corregedoria-Geral da União – desempoderamento da
CGU); esta pode processar apenas a administração pública estrangeira; o cargo
de Ministro é político, logo, “é uma raposa encarregada de cuidar do
galinheiro”; criou-se (ao arrepio da lei) um “pedido de reconsideração” da
decisão (que é fonte de novas corrupções); também se instituiu uma investigação
preliminar sigilosa (que vai funcionar como filtro de impunidade e de
corrupção); dá margem para se limitar a multa a 5% sobre o faturamento da
empresa corrupção (enquanto a lei fala em 20%), regras confusas sobre o cálculo
das multas (o que abre ensejo para anulações no Judiciário), tentativa de
alijamento do Ministério Público das ações civis de reparação dos danos, por
meio da compliance abre-se
possibilidade de anistia para as empresas etc. O Ministério Público deveria
buscar a anulação do decreto presidencial (conclui Carvalhosa).
Ainda que todas as críticas não
sejam indiscutíveis, como acontecem essas “manobras diversionistas” para evitar
a aplicação da lei? Como ainda vivemos (desde JK e a ditadura) a “república das
empreiteiras”? As classes sociais dominantes ou reinantes ou influentes
(financeiras, industriais, comerciais, agrárias e políticas) são as donas do
poder e do Estado, que condensa as relações de domínio e de poder. Essa é sua
nota mais específica (e, ao mesmo tempo, mais invisível) (Jaime Osorio,El
Estado en el centro de la mundialización: 23). Quem comanda o
Estado visível (as instituições, o aparato administrativo, as leis e
regulamentos)é o Estado invisível, osistema (que
desempenha o papel de reproduzir as desigualdades de poder).
É um mito a igualdade sugerida
pela democracia liberal (cada cabeça um voto). Os donos do poder (incluindo as
empreiteiras) “compram” o poder político e administrativo para a satisfação dos
seus interesses. A sociedade é um espaço de forças, mas é com muito custo que
as forças dominadas rompem o domínio das classes dominantes. A exploração
pressupõe um campo estatal de domínio e de força. O Estado reproduz as relações
de exploração e de domínio. O Estado é sempre um Estado de classes. As teorias
contratualistas (Hobes, Locke e Rousseau) estão mortas. O Estado só muito
excepcionalmente representa os interesses do todos. Ele é classista. É uma
ilusão afirmar que o Estado pertence a todos. Isso é uma farsa! Quem financia
as campanhas dos políticos são os que mandam.
FONTE: FATONOTÓRIO
http://www.fatonotorio.com.br/artigos/lei-anticorrupcao-regulamentacao-da-dilma-busca-a-farsa/20310/
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