O STJ e os 25 anos do Código de Defesa do Consumidor
ESPECIAL
Um quarto de século. Em 2015, o
Brasil comemora os 25 anos da promulgação de seu Código de Defesa do
Consumidor, mais conhecido como CDC, com a
certeza deque a lei “pegou” e vem sendo rigorosamente aplicada pelo Judiciário
nos conflitos entre empresas e clientes.
O consumidor continua sendo o lado frágil
da relação comercial, mas agora ele sabe que pode cobrar a qualidade dos
produtos e serviços prestados e exigir seus direitos. E se a relação
amigável não surtir efeito, ele pode recorrer a um instrumento social e
democrático: a Justiça.
Nesse contexto, a importância do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a consolidação do CDC é
inegável. Com suas decisões, o Tribunal da Cidadania mudou o
comportamento dos produtores e revendedores, aperfeiçoou os serviços
prestados pelas empresas e estimulou a conscientização do consumidor sobre
seus direitos e deveres.
Responsável pela uniformização da
legislação infraconstitucional, o STJ tem prestigiado o CDC desde a sua entrada
em vigor, em março de 1991 (a publicação foi em setembro de 1990). De lá para
cá, foram milhares de julgados, várias súmulas e uma ampla jurisprudência
consolidada para aperfeiçoar a relação entre consumo e cidadania.
Súmulas
Súmula é um enunciado que resume o
entendimento reiterado do tribunal sobre determinada matéria e objetiva
facilitar a solução do conflito pela aplicação da jurisprudência já definida
nos precedentes. Entre as várias súmulas editadas pelo STJ acerca do CDC –
tratando de temas como serviços de proteção ao crédito, telefonia, planos de
saúde e muitos outros –, uma cristalizou o reconhecimento do cliente bancário
como consumidor de produtos e serviços.
Durante muito tempo, os bancos
relutaram em enquadrar seus clientes como consumidores. Um dos primeiros casos
foi julgado no STJ em 1995 e envolveu a cobrança de taxa de juros por falta de pagamento.
Na época, o Banco do Brasil recorreu ao STJ sustentando que o CDC não podia ser
aplicado por se tratar de uma relação banco/cliente, e não banco/consumidor.
O STJ concluiu que o banco “está
submetido às disposições do CDC, não por ser fornecedor de um produto, mas
porque presta um serviço consumido pelo cliente, que é o consumidor final desse
serviço”. Entendeu também que os direitos do cliente “devem ser igualmente
protegidos como os de qualquer outro, especialmente porque nas relações
bancárias há difusa utilização de contratos de massa, onde, com mais
evidência, surge a desigualdade de forças e a vulnerabilidade do usuário” (REsp
57974).
Anos mais tarde, em 2004, o STJ
aprovou a Súmula 297, segundo a qual “o Código de Defesa do Consumidor é
aplicável às instituições financeiras”. É daquele mesmo ano a Súmula 285,
que estabelece para os contratos bancários posteriores ao CDC a incidência da
“multa moratória nele prevista”.
Inadimplência e previdência
privada
Duas súmulas do STJ tratam da
inscrição do consumidor ematraso nos serviços de proteção ao crédito, como
o SPC e a Serasa. A Súmula 359 diz que “cabe ao órgão mantenedor do cadastro de
proteção ao crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição”, e
a Súmula 323 determina que “a inscrição de inadimplente pode ser mantida nos
serviços de proteção ao crédito por, no máximo, cinco anos”.
Também no tocante às relações de
consumo, a Súmula 321 estabeleceu que “o Código de Defesa do Consumidor é
aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus
participantes”. Tal qual ocorreu anteriormente com o reconhecimento para os clientes
bancários, os participantes de planos de previdência privada devem ser
considerados consumidores porque são pessoas que adquirem prestação de serviço
como destinatários finais.
Serviços de saúde
Também foi uma súmula do STJ que
definiu como abusiva a prática dos planos de saúde de limitar as despesas com
internação. Após decisões reiteradas, no ano 2000 o tribunal aprovou a Súmula
302: “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a
internação hospitalar do segurado.”
A jurisprudência do STJ é no sentido
de que a recusa indevida ou injustificada pela operadora de plano de
saúde a autorizar a cobertura financeira de tratamento médico a
que esteja legal ou contratualmente obrigada enseja reparação a título de dano
moral, por agravar a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito
do beneficiário.
Ainda no ramo da saúde, a Súmula 469
vedou a discriminação do idoso nos reajustes das mensalidades dos planos sob
alegação de alta sinistralidade do grupo, decorrente da maior
concentração de segurados nas faixas etárias mais avançadas. Todavia, essa
vedação não envolve os demais reajustes permitidos em lei, que ficam garantidos
às empresas operadoras dos planos, sempre ressalvada a proibição de práticas
abusivas.
Telefonia e
estacionamento
“É legítima a cobrança da tarifa
básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa.” O enunciado da súmula 356
fixou que a cobrança não constitui abuso proibido pelo CDC, quer sob o ângulo
da legalidade, quer por se tratar de serviço que é necessariamente disponibilizado,
de modo contínuo e ininterrupto, aos usuários.
Outro enunciado envolvendo a
aplicação do CDC é a Súmula 130, que dispõe que “a empresa responde,
perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículos ocorridos em seu
estacionamento”.
Restituição de
valores
Criado pela Lei 8.078, de 11 de
setembro de 1990, o CDC trouxe para o ordenamento jurídico a Política
Nacional de Relações de Consumo, que tem por objetivo o atendimento das
necessidades dos consumidores; o respeito à sua dignidade, saúde e segurança; a
proteção de seus interesses econômicos; a melhoria da sua qualidade de vida;
bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.
Em 2013, a Segunda Seção do STJ, em
julgamento de recurso repetitivo (REsp 1.300.418), firmou o entendimento de que
é abusiva a cláusula contratual que determina
a restituição dos valores devidos somente
ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese
de resolução de contrato de promessa de compra e venda de
imóvel por culpa de quaisquer contratantes.
Assim, em tais avenças submetidas às
regras do CDC, deve ocorrer a imediata restituição das
parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa
exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o
comprador quem deu causa ao desfazimento.
Para o STJ, a devolução dos valores
somente após o término da obra retarda o direito do consumidor à restituição da
quantia paga, em violação ao artigo 51, II, do CDC. Constitui ainda vantagem
exagerada para o fornecedor, conforme o inciso IV do mesmo artigo.
Também em recurso repetitivo, o
tribunal decidiu que a restituição das parcelas pagas por desistente de
consórcio deve ocorrer em até 30 dias do prazo previsto em contrato para o
encerramento do grupo a que estiver vinculado o participante (REsp 1.119.300).
De avião a futebol
Os consumidores que utilizam
transporte aéreo tiveram seus direitos reconhecidos com a aplicação do CDC nos
casos de responsabilidade do transportador aéreo por extravio de bagagem e por
atraso de voo. Para o STJ, o contrato de transporte consiste em obrigação de
resultado, e a falha no serviço caracteriza manifesta prestação inadequada.
No julgamento do REsp 1.280.372, o
tribunal concluiu que a postergação da viagem superior a quatro horas constitui
falha no serviço de transporte aéreo contratado e gera o direito à
devida assistência material e informacional ao consumidor lesado,
independentemente da causa do atraso.
O dano moral decorrente
de atraso de voo prescinde de prova, e
a responsabilidade de seu causador opera-se in re ipsa em
virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo
passageiro. O mesmo vale para o caso de extravio de bagagem (AREsp
582.541).
Recentemente, a Terceira Turma do STJ
aplicou o CDC para condenar um clube de futebol e a Federação Paulista ao
pagamento de indenização por danos materiais e morais a um torcedor que sofreu
lesões ao cair de uma das rampas de acesso ao estádio do Morumbi.
O colegiado concluiu que a
responsabilidade das entidades organizadoras, dos clubes e de seus dirigentes pelos
danos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios é
objetiva e solidária, em face da incidência dos artigos 14, parágrafo 1º, e 7º
do CDC (REsp 1.513.245).
Além da punição dos que praticam atos
ilícitos nas relações de consumo, o CDC esclarece os fabricantes, fornecedores
e prestadores de serviços sobre suas obrigações, contribuindo para uma atitude
empresarial de maior respeito ao consumidor, o que acaba por ampliar e
fortalecer sua presença no mercado.
http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/Destaques/O-STJ-e-os-25-anos-do-C%C3%B3digo-de-Defesa-do-Consumidor#
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