Convivência com expectativa de formar família no futuro não configura união estável
DECISÃO
Para que um relacionamento amoroso se
caracterize como união estável, não basta ser duradouro e público, ainda que o
casal venha, circunstancialmente, a habitar a mesma residência; é fundamental,
para essa caracterização, que haja um elemento subjetivo: a vontade ou o
compromisso pessoal e mútuo de constituir família.
Seguindo esse entendimento exposto
pelo relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a Terceira Turma do Superior Tribunal
de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um homem que sustentava ter
sido namoro – e não união estável – o período de mais de dois anos de
relacionamento que antecedeu o casamento entre ele e a ex-mulher. Ela
reivindicava a metade de apartamento adquirido pelo então namorado antes de se
casarem.
Depois de perder em primeira
instância, o ex-marido interpôs recurso de apelação, que foi acolhido por
maioria no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Como o julgamento da apelação
não foi unânime, a ex-mulher interpôs embargos infringentes e obteve direito a
um terço do apartamento, em vez da metade, como queria. Inconformado, o homem
recorreu ao STJ.
No exterior
Quando namoravam, ele aceitou oferta
de trabalho e mudou-se para o exterior. Meses depois, em janeiro de 2004, tendo
concluído curso superior e desejando estudar língua inglesa, a
namorada o seguiu e foi morar com ele no mesmo imóvel. Ela acabou permanecendo
mais tempo do que o previsto no exterior, pois também cursou mestrado na sua
área deatuação profissional.
Em outubro de 2004, ainda no exterior
– onde permaneceram até agosto do ano seguinte –, ficaram noivos. Ele comprou,
com dinheiro próprio, um apartamento no Brasil, para servir de residência a ambos.
Em setembro de 2006, casaram-se em comunhão parcial – regime em que
somente há partilha dos bens adquiridos por esforço comum e durante o
matrimônio. Dois anos mais tarde, veio odivórcio.
A mulher, alegando que o
período entre sua ida para o exterior, em janeiro de 2004, e o casamento, em
setembro de 2006, foi de união estável, e não apenas de namoro, requereu na
Justiça, além do reconhecimento daquela união, a divisão do apartamento
adquirido pelo então namorado, tendo saído vitoriosa em primeira instância.
Queria, ainda, que o réu pagasse aluguel pelo uso exclusivo do imóvel desde o
divórcio – o que foi julgado improcedente.
Núcleo familiar
Ao contrário da corte estadual, o
ministro Bellizze concluiu que não houve união estável, “mas sim namoro qualificado,
em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram, para o
futuro – e não para o presente –, o propósito de constituir entidade familiar”.
De acordo com o ministro, a formação do núcleo familiar – em que há o
“compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material” – tem de ser
concretizada, não somente planejada, para que se configure a união
estável.
“Tampouco a coabitação evidencia a
constituição de união estável, visto que as partes, por contingências e
interesses particulares (ele, a trabalho; ela, por estudo), foram, em momentos
distintos, para o exterior e, como namorados que eram, não hesitaram em residir
conjuntamente”, afirmou o ministro no voto.
Por fim, o relator considerou que,
caso os dois entendessem ter vivido em união estável naquele período anterior,
teriam escolhido outro regime de casamento, que abarcasse o único imóvel de que
o casal dispunha, ou mesmo convertido em casamento a alegada união estável.
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