“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

Segunda Turma mantém responsabilidade do município no incêndio do Canecão Mineiro



DECISÃO

Em decisão unânime, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação da prefeitura de Belo Horizonte ao pagamento de indenização para sete vítimas que sobreviveram ao incêndio na casa de espetáculos Canecão Mineiro.

O acidente aconteceu em 2001 e, em vários aspectos, foi semelhante ao incêndio da Boate Kiss, que matou 242 pessoas na cidade de Santa Maria (RS), em 2013.

Na tragédia de Belo Horizonte, sete pessoas morreram e 197 ficaram feridas em decorrência do incêndio provocado pela utilização de artigos pirotécnicos dentro do salão, durante um show. Os fogos atingiram o teto, e as chamas se espalharam rapidamente pela estrutura feita de isopor e plástico.


Sem alvará

A sentença, confirmada no acórdão de apelação, reconheceu aresponsabilidade civil do município, na modalidade culpa administrativa, pois a casa de show não tinha alvará de funcionamento nem havia adotado medidas de prevenção de incêndio.

O município alegou que o alvará de funcionamento não seria capaz de impedir o incêndio. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), porém, entendeu que se a casa tivesse sido compelida pelo município a cumprir as exigências para obtenção do alvará, a tragédia seria menor.

O atendimento dessas exigências, segundo o acórdão do TJMG, “possibilitaria que os frequentadores da casa de espetáculos se evadissem do local através de saídas de emergência devidamente sinalizadas e de acordo com as normas regulamentares de segurança, o que poderia ter evitado mortes ou minorado os danos”.

O valor da indenização por danos morais foi fixado em R$ 23 mil para a maioria das vítimas, chegando a cerca de R$ 30 mil, em um dos casos, devido à inclusão de danos estéticos e materiais.

Responsabilidade estatal

No recurso especial ao STJ, a prefeitura insistiu na ausência de nexo de causalidade entre a omissão do município e o evento. Também questionou o valor das indenizações e alegou a impossibilidade de cumulação de danos morais e estéticos.

O relator, ministro Og Fernandes, negou provimento ao pedido. Em relação à ausência de nexo de causalidade, ele rechaçou a argumentação da prefeitura por considerar presentes todos os requisitos necessários à constatação da existência de responsabilidade estatal por omissão.

“Tem-se a presença do dano (incêndio), para o qual concorreram as falhas da administração municipal (nexo de causalidade) na fiscalização das condições do local onde ocorreu a tragédia (omissão no cumprimento de dever legal)”, disse o ministro.

“Para a modificação de tais conclusões, seria necessário o revolvimento dos elementos fático-probatórios coligidos aosautos, medida sabidamente vedada em sede de recurso especial nos termos do disposto na Súmula 7”, acrescentou.

Razoabilidade

A impossibilidade de cumulação das indenizações de dano estético e dano moral também foi afastada pelo relator. O tema está tratado na Súmula 387 do STJ, que admite essa cumulação.

Quanto à revisão dos valores, Og Fernandes afirmou que esse tipo de pretensão só é possível em recurso especial quando a indenização se mostra exorbitante ou irrisória, “o que não se verifica na espécie, em atenção aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade”.


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