Principal critério para avaliar astreintes deve ser a obrigação original e não o valor acumulado
DECISÃO
A proporcionalidade da multa por
descumprimento de decisão judicial – ou multa cominatória, também chamada de
astreintes – deve ser avaliada em vista da obrigação a que ela se refere e não
do montante acumulado em razão da resistência da parte em cumprir a
determinação. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou
esse entendimento ao julgar recurso do Banco Santander num caso em que a
obrigação principal era de R$ 4.620 e a multa, fixada em R$ 1 mil por dia de
atraso, chegou a R$ 237 mil.
De acordo com o relator do recurso,
ministro Marco Aurélio Bellizze, não seria razoável analisar somente o valor
final da multa em relação à obrigação inicial. Ele disse que algumas pessoas e
empresas adotam a “perversa estratégia” de não cumprir a decisão judicial,
deixando crescer o valor devido em proporções gigantescas, para depois bater às
portas do Judiciário e pedir a revisão de valores com o argumento de que o
montante se tornou inviável ou vai gerar enriquecimento sem causa da outra
parte.
“O deslocamento do exame da
proporcionalidade e da razoabilidade da multa diária, em cotejo com a prestação
que deve ser adimplida pela parte, para a fase de sua fixação, servirá de
estímulo ao cumprimento da obrigação, na medida em que ficará evidente a
responsabilidade do devedor pelo valor total da multa, que somente aumentará em
razão de sua resistência em cumprir a decisão judicial”, disse o ministro.
Oito meses
O recurso do Santander era contra
decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que restabeleceu o
valor da multa cominatória de R$ 1 mil por dia pelo atraso no cumprimento da
decisão judicial.
Na origem do caso, o juiz determinou
que o valor de R$ 4.620, referente a honorários advocatícios, fosse transferido
da conta em que estavam bloqueados para uma conta judicial, sob pena de multa
diária de R$ 1 mil. O banco resistiu por quase oito meses a fazer o depósito, e
o valor acumulado chegou a R$ 237 mil.
O Santander opôs exceção de
pré-executividade, acolhida pelo juiz para reduzir o total da multa ao mesmo
valor da obrigação principal. Essa decisão foi reformada pelo tribunal
estadual, que restabeleceu o valor da multa original. No recurso ao STJ, o
banco afirmou que o valor das astreintes era excessivo e que sua redução seria
necessária para evitar o enriquecimento ilícito da outra parte.
Segundo o ministro Bellizze, o artigo
461, parágrafo 6º, do Código de Processo Civil (CPC) admite que o valor das
astreintes seja alterado quando se mostrar insuficiente ou excessivo, mesmo
após o trânsito em julgado da sentença. Já a jurisprudência da Segunda Seção do
STJ estabelece que a redução da multa é admitida quando a sua fixação ocorrer
em valor muito superior ao discutido na ação judicial em que foi imposta, de
forma a evitar enriquecimento sem causa.
Outro critério
No entanto, para Bellizze, o exame de
recursos como o do Santander admite outro critério. Segundo ele, a simples
comparação entre a obrigação principal e o valor total da multa levaria
fatalmente à redução deste último, apenas pelo fato de ser muito superior, mas
isso prestigiaria a “recalcitrância do devedor” em prejuízo da efetividade da
prestação jurisdicional.
“Penso que, nessas hipóteses, outro
parâmetro pode ser utilizado, possivelmente com maior eficácia”, disse,
acrescentando que a redução não deve ser admitida quando se verifica que a
multa foi estabelecida de forma proporcional à condenação e só alcançou um
valor expressivo em decorrência da inércia da parte que não cumpriu a
determinação judicial.
Ao analisar as peculiaridades do caso,
em que a obrigação principal era de R$ 4.620, o relator votou pela redução da
multa diária de R$ 1 mil para R$ 500, entendendo que este valor é mais
proporcional ao da obrigação principal, mas sem alterar o número de dias em
atraso.
“Tenho como adequada a redução da
condenação não em razão de seu valor total, perfeitamente suportável pelo
recorrente, mas apenas pela desproporção verificada no valor da multa diária
fixada”, afirmou o ministro, cujo voto foi seguido de forma unânime pelo
colegiado.
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