“O poder só é efetivado enquanto a palavra e o ato não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades.” (ARENDT, Hannah Condição Humana, 2007, p. 212)

Enrolar a namorada por 39 anos não gera indenização



A Justiça mineira deu ganho de causa a um aposentado que estava sendo processado por ter desistido de se casar com sua "ex-companheira", também aposentada. Ela sustentava que o ex-namorado, depois de alimentar suas esperanças quanto ao casamento por 39 anos, enquanto eles se relacionavam, descumpriu as promessas e rompeu com ela, causando-lhe sofrimento e decepção.


Segundo a mulher, o envolvimento começou quando ela tinha 15 anos e o parceiro, 22. Ela diz que, por orientação dele, tomou anticoncepcionais durante do início do namoro até os 40 anos, quando entrou na menopausa. Em julho de 2011, quando ela estava com 54 anos, ele sumiu, sem dar explicações. A mulher buscou a Justiça em janeiro de 2012, alegando que, como entregou “sua vida, seus sonhos e sua juventude, para se ver repentinamente abandonada e desprezada”, ela merecia uma reparação.

O aposentado argumentou que a namorada consentiu na união, que consistia em encontros esporádicos espaçados por quinze dias ou mais, e só após dez anos começou a falar em casamento. Ele também negou que o fim do relacionamento tivesse ocorrido de forma súbita, alegando que isso ocorreu em 2008, em decorrência do comportamento imaturo da parceira. De acordo com o homem, tampouco seria verdade que a ex-namorada desejasse ter filhos, pois ela, enquanto esteve com ele, não se importou com isso. Por fim, ele sustentou que ninguém pode ser punido por terminar um relacionamento e que o procedimento correto por parte da mulher seria ajuizar ação de reconhecimento de união estável.
  
O juiz Eduardo Veloso Lago, da 25ª Vara Cível de Belo Horizonte, reconheceu que a aposentada poderia se sentir ressentida com a ruptura, mas afirmou que o fato não caracteriza conduta passível de ser penalizada com indenização. Para o magistrado, o estabelecimento e a manutenção de um vínculo amoroso baseia-se na liberdade e da livre escolha individual.

“Ninguém pode ser compelido a se unir ou a permanecer unido indefinidamente. Estivesse insatisfeita com a relação, a autora poderia ultimá-la ao longo de todos estes anos. Do mesmo modo, é juridicamente incensurável a opção do réu em finalizar o relacionamento a qualquer tempo”, sentenciou, em 23 de agosto de 2013.

A mulher recorreu, defendendo que se tratava da quebra de uma promessa e ressaltando o efeito psicológico da atitude do ex-parceiro sobre ela.

O desembargador Moacyr Lobato, da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), rejeitou recurso da aposentada e confirmou decisão da 25ª Vara Cível de Belo Horizonte. O relator esclareceu que a frustração de expectativa de casamento não justifica indenização por danos morais, porque não viola dever jurídico legítimo, já que não se comprovou haver compromisso pré-nupcial ou acerto formal entre as partes.

“Cumpre destacar que os vínculos pessoais estabelecidos entre as partes, relativos a relacionamento afetivo, podem ser rompidos por diferentes razões de cunho pessoal. Assim, nada impede que livremente as pessoas possam alterar suas convicções íntimas e pessoais quanto aos relacionamentos afetivos. O pedido de indenização por danos morais, no presente caso, mostra-se infundado”, ressaltou, afirmando, ainda, que não há nos autos prova de conduta do parceiro que efetivamente tenha causado à ex-namorada constrangimentos e humilhações.

  
FATO NOTÓRIO

Órgão: TJ/MG
Número do Processo: 1087985-61.2012.8.13.0024

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