Conclusão fática que fundamenta sentença não faz coisa julgada
O fato de uma sentença adotar
premissa fática absolutamente divergente daquela que inspirou o pronunciamento
de uma sentença anterior, já transitada em julgado, não afasta a incidência do
artigo 469 do Código de Processo Civil (CPC), o qual afirma que “não faz coisa
julgada a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença”.
Essa foi a decisão da Terceira Turma
do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial sob
relatoria do ministro Sidnei Beneti. No caso, o relator deixou claro que o
instituto da coisa julgada não se presta apenas a impedir a reiteração de ações
idênticas. É um fenômeno muito mais amplo que opera em diversas situações.
O artigo 469 do CPC determina que não
fazem coisa julgada os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance
da parte dispositiva da sentença; a verdade dos fatos, estabelecida como
fundamento da sentença; e a apreciação da questão prejudicial, decidida
incidentalmente no processo.
Qualidade agregada
O artigo 301, parágrafo 3º, do mesmo
código estabelece que “há coisa julgada quando se repete ação que já foi
decidida por sentença, de que não caiba recurso”. No entanto, o relator destaca
que não é possível interpretar esse dispositivo de forma isolada. Ele está
inserido em um sistema maior e não é propriamente um efeito da sentença, mas
uma qualidade que se agrega aos seus efeitos.
Uma vez assumido que a coisa julgada
é uma qualidade que se agrega à declaração contida na sentença e que essa
declaração somente existe como uma resposta jurisdicional, é inevitável
concluir que a coisa julgada atinge apenas a parte dispositiva da sentença. Nem
o relatório, nem a fundamentação da sentença podem se revestir da coisa
julgada, porque nestes ainda não existe propriamente um julgamento.
O caso
A controvérsia foi discutida no
recurso interposto com uma pousada que litiga com uma construtora.
Inicialmente, as empresas ajuizaram ações julgadas conjuntamente. A construtora
cobrava dívida remanescente da aquisição de imóvel pela pousada, que, por sua
vez, queria rescindir o contrato alegando ter pago valor muito superior ao de
mercado.
Sentença transitada em julgado negou
a ação de cobrança e reconheceu que a pousada havia pago pelo imóvel valor três
vezes superior ao de mercado. Mas o contrato foi mantido porque o negócio havia
se concretizado, de forma que sua rescisão seria ilícita.
A pousada ajuizou nova ação, agora
pedindo a devolução dos valores pagos a mais pelo imóvel. Em primeiro grau, o
pedido foi negado porque prova pericial concluiu pela inexistência de valores
pagos a maior. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais negou a apelação.
No recurso ao STJ, discutiu-se a
ocorrência ou não de ofensa à coisa julgada, tendo em vista que, na segunda
ação, não foi reconhecido o pagamento a maior apontado na primeira ação.
Contudo, conforme estabelecido no artigo 469 do CPC, a verdade dos fatos
estabelecida como fundamento de sentença não faz coisa julgada.
Esta notícia se refere ao processo: REsp 1298342
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