"FALA SÉRIO" - STF decidirá se juiz deve ser chamado de 'doutor'
O Supremo Tribunal Federal deverá analisar na próxima semana
uma ação em que um juiz do estado do Rio de Janeiro exige ser chamado de
“doutor” e “senhor” pelos funcionários do prédio onde mora. O processo foi
distribuído ao ministro Ricardo Lewandowski na semana passada.
O caso data de agosto de 2004. Antonio Marreiros da Silva Melo
Neto, juiz titular da 6ª Vara Cível de São Gonçalo, na região metropolitana do
Rio, pediu ajuda a um funcionário do prédio para conter um vazamento em seu
apartamento. Por não ter permissão da síndica, o empregado negou o socorro. Os
dois discutiram e, segundo o juiz, o homem passou a chamá-lo de “cara” e
“você”, com o intuito de desrespeitá-lo. Marreiros pediu para ser tratado
como “senhor” ou “doutor”. “Fala sério” foi a resposta que obteve.
Marreiros, então, entrou com uma ação na Justiça e, em setembro
do mesmo ano, obteve liminar favorável do desembargador Gilberto Dutra Moreira,
da 9ª Câmara Cível do TJ-RJ. Moreira criticou o juízo de primeiro grau, que não
proveu a antecipação de tutela ao colega de profissão, classificando a recusa
de “teratológica”.
“Tratando-se de magistrado, cuja preservação da dignidade e do
decoro da função que exerce, e antes de ser direito do agravante, mas um dever
e, verificando-se dos autos que o mesmo vem sofrendo, não somente em enorme
desrespeito por parte de empregados subalternos do condomínio onde reside, mas
também verdadeiros desacatos, mostra-se, data vênia, teratológica a decisão do
juízo a quo ao indeferir a antecipação de tutela pretendida”, escreveu o
desembargador.
Na época, o presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do
Brasil do Rio de Janeiro, Octávio Augusto Brandão Gomes, repudiou a decisão.
"Todos nós somos seres humanos”, afirmou. “Ninguém nessa vida é melhor do
que o outro só porque ostenta um título, independente de ter o primeiro ou
segundo grau completo ou curso superior", completou.
A decisão foi confimada em março do ano
seguinte, quando a 9ª Câmara Cível da Corte fluminense atendeu, por maioria de
votos (2 a 1) o pedido de Marreiros.
Em maio, no entanto, Marreiros obteve
decisão contraria do juiz Alexandre Eduardo Scisinio, da 9ª Vara Cível de
Niterói, que entedeu não competir ao Judiciário decidir sobre a relação de
educação, etiqueta, cortesia ou coisas do gênero.
De acordo com a deliberação de Scisinio,
“doutor” não é forma de tratamento, e sim título acadêmico utilizado apenas
quando se apresenta tese a uma banca e esta a julga merecedora de um
doutoramento. O título é dado apenas às pessoas que cumpriram tal exigência e,
mesmo assim, no meio universitário.
Ele ressaltou, ainda, que o tratamento
cerimonioso é reservado a círculos fechados da diplomacia, clero, governo,
Judiciário e meio acadêmico, mas na relação social não há “ritual litúrgico” a
ser obedecido.
Marreiros recorreu ao TJ-RJ e obteve
outra decisão contrária. Em 2006, enviou Recurso Extraordinário ao STF,
argumentando que o caso diz respeito à Constituição por envolver os princípios
da dignidade da pessoa humana e da igualdade.
AI 860.598
http://www.conjur.com.br/2014-abr-19/stf-julgara-acao-juiz-chamado-doutor
Comentários
Postar um comentário