Desumanidade na Bahia: prisões inseguras e falta assistência médica
LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
O sistema prisional da Bahia,
conforme constatação do Mutirão do CNJ (janeiro de 2010 a janeiro de 2011),
não conta com perfil distinto do que se comprovou em outros estados: o sistema
carcerário do estado baiano padece de morosidade judiciária, superlotação,
insegurança e falta de estrutura e de assistência médica. A maior penitenciária
do estado, Lemos de Brito (onde se encontram 1.400 presos), foi construída
ainda na década de 50, carecendo de vagas, assistência médica e higiene. Em
razão da grande falta de espaço, muitos presos dormem no chão, embaixo das
camas. Quando todos os detentos se concentram no pátio, este mais se parece um
campo de concentração.
Uma pergunta que poderia ser
feita: os juízes sabem dessa lastimável situação? De acordo com o Estado de
Direito vigente acham-se proibidos os tratamentos desumanos e cruéis. Os
presídios brasileiros, em razão da inerente ilegalidade, violam todas as leis,
tratados e a Constituição. Se a CF fosse levada a sério, nesse campo prisional,
com certeza a quase totalidade dos presídios brasileiros seriam interditados,
em razão da desumanidade, típica do tratamento (absurdo) dado às coisas ou aos
insetos (muitas vezes também lamentavelmente aos animais). Os juízes
brasileiros deveriam refletir muito todas as vezes que mandam alguém para a
cadeia. Estão determinando uma pena cruel, desumana e degradante. Claro que, em
muitos casos, a prisão é inevitável. A sentença do juiz, no entanto, somente
não seria inconstitucional, se contássemos com um sistema prisional cumpridor
das regras jurídicas vigentes.
O Brasil era livre para assumir
compromissos internacionais, mediante tratados. Uma vez assumidos, devem ser
cumpridos (pacta sunt
servanda). Na medida em que o Brasil não cumpre suas obrigações
internacionais, destacando-se, dentre elas, a de tutelar ou favorecer o
cumprimento dos direitos humanos (das vítimas e dos réus), está praticando
crimesjushumanitários.
Quando são denunciados esses
crimes jushumanitários, é impressionante a diferença de
reação na população, na mídia, nas universidades etc. Em países mais evoluídos,
onde se respeita a cultura dos direitos humanos, a censura contra o Estado
criminoso seria fortíssima, contundente. Não é isso o que se vê no Brasil ou
mesmo na América Latina, onde se constata uma aceitação geral da degradação e
da desumanidade. Nesse setor, estamos atrasados (em relação à Europa, por
exemplo), mais de meio século. O que lá se concebe como inadmissível, aqui se
aceita como natural. Sem educação em direitos humanos vamos perpetuando nosso
desprezo pelos direitos dos outros, o que significa falta de ética, entendida
como “a arte de viver bem humanamente” (Savater), ou seja, respeitando os
demais humanos como seres humanos.
*LFG – Jurista e cientista
criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Codiretor do Instituto Avante Brasil
e do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz
de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me nas redes sociais: www.professorlfg.com.br
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